3.27.2009

ELSA MUN 2009

Se no ELSA MUN 2008 representara França na Assembleia Geral da Nações Unidas, este ano digamos que estou a ser (por três dias) Silvio Berlusconi.

3.23.2009

The Wrestler

Depois de ter ficado em falta (por não ter visto e já não estarem nas salas de cinema) com Frost/Nixon, Rachel Getting Married e The Visitor, decidi ver hoje The Wrestler - O Lutador, do realizador Darren Aronofsky.
Brainstorming superficial sobre a película: achei um filme que se possa dizer "mediano"; o protagonista tem uma interpretação sublime; a narrativa em si, isto é, o argumento propriamente dito, não me encantou.
The Wrestler conta a história de Ron ou Randy Robinson, The Ram, um lutador caído em desgraça que, vinte anos antes, nos 80s, fora cartaz de muitos combates, alcançando a fama e o dinheiro. Hoje, vive sozinho numa roulote (ou no seu carro), com problemas de sustento económico, além de não ter família, Randy é a autêntica "diva esquecida". Depois de um combate, vem a ter um enfarte, alertando-lhe o médico de que teria que deixar o wrestling, pois poderia morrer. Enfim, as situações secundárias da narrativa como, a relação díficil que mantém com a filha Stephanie (Evan Rachel Wood), ou ainda, a (única) amizade que tem com Pam ou Cassidy (numa óptima interpretação de Marisa Tomei), vão surgindo entre lutas, lutas e mais lutas.
O maior valor acrescentado da longa-metragem é sem dúvida Mickey Rourke. Tem uma interpretação genuinamente fantástica. É o homem esquecido, abandonado (talvez até por si, dado o seu percurso de vida), ferido, que é mais esteróides que "cabeça", mas que não deixa de ter emoção, sentimentos, coração. Como (quase) repetidamente foi dito depois de ter ganho o Golden Globe e o BAFTA, o filme retrata a vida de um lutador, sendo que, é de tal forma semelhante à vida profissional e artística de Rourke (afinal este optando por se dedicar ao Boxe, abandonou (em parte) o cinema no final dos anos oitenta, passando a ficar apenas com fitas menores) que, mais parecem confundir-se o personagem com o actor. Discordo em parte: Randy começa e acaba no filme da mesma forma; Rourke "ressuscita dos anos 80" não para a fama, mas para o reconhecimento do público e da crítica. Com uma caracterização física extremamente adequada ao seu "eu" e aos espaços em que se vai movimentando, Rourke é ainda "filho" de uma geração onde os plásticos, os brilhos e as brilhantinas, o mundo do show-off e das luzes, das quedas e ribaltas esporádicas, do heavy metal, das licras e cabedais justos, enfim, de uma geração que não reconhece a contemporâniedade do mundo actual (não se revendo nele) e que se sente uma "mera carne velha e esquecida", como chega a caracterizar-se a si mesmo. Rourke, ri, chora, sofre, luta, tem sexo num WC público, droga-se, enfim. É o actor certo para o concreto papel.
É ainda de referir a interessante analogia que se vai fazendo entre os personagens de Mickey Rourke e Marisa Tomei: tal como ele, ela é uma stripper "fora de prazo", gasta, e com uma enorme dificuldade nas relações humanas.
Acerca dos aspectos de realização, de notar que Aronofsky usa e abusa da câmara ao ombro, quase prototipando uma espécie de filmagem em documentário, adoptando uma visão neo-realista, fria, sem floreados ou efeitos especiais, crua e acima de tudo, tão humana sobre tudo, de todos os pormenores, (até mesmo dos aparentemente mais insignificantes); durante toda a narrativa, o realizador vai seguindo os personagens por trás, num verdadeiro plano de intimidade, proximidade e transparência.
Os espaços conseguem uma relação quase umbilical com a trama, a boate onde Cassidy se despe e que Randy frequenta é também ela um último resquício dos 80s.
Nota: 7

3.20.2009

Manhattan

Depois de ter escrito acerca de Vicky Cristina Barcelona e, em concreto sobre Woody Allen afirmando: "mais, só não o adorei porque não sou propriamente fã do realizador", senti que fora algo "vago", melhor, pouco explicativo com a mesma expressão, no limite, quase injusto para com o cineasta. Precisamente por isto, não servirá a presente crónica como uma expressão contraditória à opinião publicada anteriormente sobre Allen, mas antes como uma opinião acerca de um filme (que adoro) incontornável na história da "Sétima Arte", e que torna Woody Allen um bom realizador.
Manhattan é se não o melhor, um dos melhores filmes de Woody Allen (a par com Annie Hall, The purple rose of Cairo ou Hannah and Her Sisters, p.e.).
Manhattan, que tem como protagonista, Allen, (além da interpretação e da realização, este foi também argumentista, juntamente com Marshall Brickman) conta a história de Isaac Davis (Woody Allen), um escritor de comédias de 42 anos, e a sua relação com Tracy (Mariel Hemingway), uma "miúda" ou litle girl (como o próprio a chamava) de 17 anos. A "isto", junta-se a friend couple, Yale Pollack (Michael Murphy) e Emily (Anne Byrne). Entretanto surge Mary Wilkie (Diane Keaton), uma philadelphier que "anda enrolada" com Yale. Entretanto já existiam Jill (Meryl Streep, num dos seus primeiros papéis), ex-mulher de Ike/Isaac, e a sua girlfriend. A meio do filme o protagonista envolve-se com Mary, deixando Tracy, vindo mais tarde Mary a reatar com Yale, e Isaac a tentar uma segunda vez com Tracy. Enfim, um turbilhão de relações que se continuasse a escrever pareceriam algo do outro mundo, no entanto, Allen simplifica-as de uma forma tão inteligente que no fim do filme tornamo-nos quase todos convictos de um certo anarquismo emocional e/ou relacional.
A longa-metragem é a pura manifestação da idolatração (em 1979) do realizador a New York City. Arrisco-me a dizer que é NYC a grande protagonista do filme, por vezes, parece-nos que Woody Allen não ignorando ou diminuindo a trama, secundariza-a para dar lugar à sua cidade: este, deixa de filmar os personagens para filmar NYC, toda ela, por completo, e com uma paixão que só ele consegue transportar para o ecrã. Poderá não ser para alguns um serão agradável ver cinema noir, contudo, só assim conseguimos sentir tudo o que WA quer com este filme.
De notar que a personagem que interpreta (Isaac Davis) é de uma densidade/complexidade psicológica incrível: ele é satírico, com uma ironia que só Allen sabe ter, inteligente, fala de Arte, Literatura, Cinema, Beleza, Vida e Morte, Sexo, muito Sexo, ele é o típico personagem que à primeira vista só por "andar" com uma "miúda" de 17 anos seria um tipo porco, deplorável, execrável, contudo, ele é tudo menos isso, é baixo, desajeitado, sem filtro naquilo que diz, por vezes azarado. Ele é quase um auto-retrato de Woody Allen.
Há um momento sublime in the end of the film, quando WA monologamente afirma que os Manhattanianos criam neuroses para si próprios evitando "problemas insolúveis e aterrorizantes sobre o universo". Com expressões de um humor inegável como, "a bisbilhotice é a nova forma de pornografia" ou ainda "quanto a relações com mulheres, eu devia receber o prémio August Strindberg"; com uma óptima banda sonora de George Gershwin, acompanhada pela Orquestra Filarmónica de Nova Iorque; Manhattan é, e citando Angela Errigo o "auge estático do romance cinematográfico entre Woody Allen e Nova Iorque".

Nota: 10

(Diz-se que comprei o cartaz/poster de Manhattan em Roma e que ficou algures num táxi a caminho do aeroporto Leonardo Da Vinci, esperando eu que já se encontre a caminho da Rua dos Vanzeleres).

3.19.2009

Man on wire

Já há alguém tempo que estava para ir ver um qualquer filme ao Teatro do Campo Alegre. Fui hoje, acompanhado de uma sala literalmente vazia. Diz certa crítica que, contrariamente aos restaurantes, quando uma sala de cinema está vazia ou quase vazia, significa que o filme é bom. Enfim, um mero barómetro (ainda) sem comprovação empírica.
Decidi ir à estreia (não do filme mas, do filme no Porto) do documentário vencedor de Oscar, na respectiva categoria este ano.
Man on wire - Homem no arame do realizador James Marsh, cria no espectador uma miscelância de sensações que, no limite quase se opõem.
O documentário expõe o nascimento, a preparação e a concretização do sonho de Philippe Petit: instalar um arame entre as torres do World Trade Center e, passar sem qualquer tipo de segurança de uma para a outra. Por um lado, retrata o surgimento de tal ideia que para o homem comum é absolutamente irreal e absurda, e, por outro lado, vai expondo importantes momentos da vida de Petit: desde passar as torres da Cathédrale Notre Dame de Paris, também por um arame suspenso, à repetição do mesmo "espectáculo", agora em Sidney.
Mesmo depois de ver Man on wire e, saber que se trata de um documentário, continuo a ter sérias dificuldades em acreditar como foi possível um ser humano ter feito aquilo. É extasiantemente utópico, e inumano tudo aquilo.
Deve notar-se também que, o impacto que o filme tem deve-se em muito à repetição excessiva de imagens das "Torres Gémeas", e daí o seu maior valor acrescentado. Mesmo sem haver qualquer tipo de referência aos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001, é assunto que constantemente nos surge na memória, afinal, para certas gerações elas eram como que o ícone máximo do Ocidente, enquanto espaço de liberdade e democracia, elas eram o mundo dito civilizado num duo de edifícios.
Mais, Marsh implicitamente relaciona certa parte da vida de Petit com a construção do WTC, como que um crescimento acompanhado e mútuo.
Há um aspecto que o documentário (no seu final) insiste repetindo por diversas vezes, porquê tudo aquilo? Porquê aquele arriscar da sua própria vida? No fundo, é algo que serve como que voz do mundo inteiro, não havendo qualquer resposta de Philippe Petit aos seus quase "admiradores(as)". Concerteza nem ele a teria.
Confesso que não sou um devoto de filmes em documentário em sentido estrito, isto é, de documentários de per si, no entanto e, mesmo sabendo que toda a película fora realizada em estúdio, o trabalho de James Marsh tem um resultado positivo. Cria para o espaço da narração, aquilo a que se designa por backstage de um estúdio: os narradores são Philippe Petit e a equipa de pessoas que o ajudou à feitura do "crime artístico do século", tendo como "cenários" p.e. material de realização e/ou produção de cinema. O momento da narração, feita em discurso directo, acompanha todo o tempo em que esta vai descrevendo o tempo da acção. Este último, muitas vezes em noir, é um exemplo de uma realização de estúdio que mais parece uma filmagem pouco cuidada da época, designadamente o Verão de 1974, facto claramente propositado; ou ainda, uma mostragem de assombrosas fotografias a preto e branco que nos mostram o francês aparentemente suspenso no ar.
Um retrato das liberdades levadas literalmente ao limite, no caso personificadas por Philippe Petit, muitos próprias e características da geração de 70.
Nota: 7

3.17.2009

Road trip

Para que o meu caro amigo Zémi não desvalorize este blog pela sua suposta, "intelectualidade".
Nota: (não cabe na escala usada).

A corte do norte

Vezes há em que vou duas vezes por semana ao cinema (um número razoável), outras como hoje em que vou duas vezes no mesmo dia. No mínimo excêntrico.
No âmbito do "Ano Agustina", coincidente com o 55º aniversário da publicação d'A Síbila, Serralves exibiu hoje, em estreia, no seu grande auditório A corte do norte, a mais recente longa-metragem do realizador português João Botelho; uma película adaptada da obra de Agustina Bessa-Luís.
Com uma sala repleta de grandes nomes das artes, como Ângelo de Sousa ou Manoel de Oliveira, e, outras tantas "sumidades" e/ou intelectualidades, umas em negro integral, quais verdadeiros críticos de arte, outras em pop kitsch, como Ricardo Trêpa numa variante I love moNeY, Inês Pedrosa do Instituto Camões, autora de Fazes-me falta, discursou na qualidade de promotora/organizadora da exposição "Agustina Bessa-Luís - Vida e Obra", tecendo os maiores elogios ao génio literário da escritora, seguindo-se João Botelho, o qual elogiou bastante o seu mestre Oliveira criticando por outro lado, Pinto Ribeiro (MC), pela apatia cultural para com a cultura e para com os artistas portugueses.
Sobre o filme: parecia uma reprodução manoelista. Ninguém diria portanto que, João Botelho realizara Corrupção em 2007, ou ainda, A mulher que acreditava ser Presidente dos Estados Unidos da América em 2003. É quase uma analepse temporal do ponto de vista artístico, sabendo que o cineasta realizara a obra Quem és tu? em 2001, filme adaptado da obra Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett.
Em A corte do norte, assistimos a uma realização dos pormenores (afinal como o próprio realizador afirmou hoje, "quando não há dinheiro para filmar uma carroça, então que se filme bem a roda"), uma realização das sombras e de um certo jogo de luzes. Tal como em Manoel de Oliveira a interpretação dos actores do filme confunde-se, por ser igual, à interpretação dos actores em teatro, qual representação oitocentista onde se troca o vulgar e informal diálogo, pela formalização/rigidez do diálogo em prosa.
Acerca da narrativa: a história de uma família, os Barros, uma família burguesa-aristocrata do Funchal. Uma família mitificada por Emília de Sousa, ou Rosalina de Sousa, ou a baronesa da Madalena do Mar, uma família marcada, e, de um certo modo com uma triste sina graças àquela mulher. Ana Moreira (actriz principal) tem com esta obra, uma boa estreia na interpretação cinéfila, interpretando várias mulheres, em vários tempos, sempre no Funchal, e que terminam todas, sem excepção, n'A corte do norte. Várias mulheres que mais parecem uma só, enfim, uma mulher intemporal sempre inadaptada ao seu tempo, bem como, às convenções sociais que o acompanham e caracterizam.
Em suma, se há quem coloque ou identifique um género ou corrente literária para Agustina Bessa-Luís, admito que se torne algo redutor: Agustina tem por um lado, o dom em cantar um Portugal, tal como Camões ou Pessoa; tem o dom de criar uma situação enjoativamente ultra-romântica, tal como Garrett (nalgumas obras pelo menos); e, por outro lado, o dom da análise, observação e crítica social, tal como Eça. Não entendo que haja portanto uma "gaveta" onde poderá ser, (por motivos de simplificação para alguns), encaixada.
Não sou de todo, grande apreciador ou admirador deste género de realização e forma de interpretação, não deixando no entanto de reconhecer uma certa qualidade do filme, daí a nota abaixo indicada.
Nota: 7

3.16.2009

Vicky Cristina Barcelona

Um dia complicado o de hoje: depois de mais uma reunião de ERASMUS na faculdade, lá fui, obrigado por certas "administrativices", à loja do cidadão tratar de coisas muito chatas. E não é que me deparo com 3 horas e muitas de fila de espera?! Medo. Ainda tentei ler a Courrier Internacional mas de nada adiantou o tédio social dos serviços de Segurança Social. Tinha portanto que ocupar o meu tempo. Pois bem, passados meses da estreia de Vicky Cristina Barcelona, do mestre Woody Allen, e, prestes a sair da única sala de cinema do Porto onde ainda está a ser exibido, decidi ocupar de alguma forma o meu tempo de espera vendo a mais recente obra do cineasta nova-iorquino.
De notar que, muita gente me aconselhou a não ir ver, dizendo, "não vás é mau", "não é Woody Allen de forma alguma", "é uma seca", "a história é sempre a mesma", enfim, "aluga depois o filme em DVD". Depois disto, estranhamente a minha curiosidade só aumentou e digo, gostei muito do filme, (mais, só não o adorei porque não sou propriamente fã do realizador).
A película diz tudo com o título, no entanto, este também poderia ter sido, Vicky Juan Oviedo, Cristina Juan Maria Barcelona, Vicky Cristina Juan Barcelona, entre outros. A narrativa, também ela escrita por Woody Allen, conta-nos o Verão em Barcelona de duas amigas: Vicky (Rebecca Hall) e Cristina (Scarlett Johansson). A primeira, muito objectiva, racional, quase puritana; a segunda, o oposto, deveras sentimental, aventureira, muito temperamental. Numa galeria de arte catalã conhecem Juan Antonio (Javier Bardem), um pintor catalão com o típico "ar de artista", e aí começa o filme, e aí começa o seu Verão em Barcelona. Até ao fim do filme Woody vai criando peripécias umas atrás das outras, mais, vai criando personagens como há muito não apereciam nos seus filmes. Com Vicky Cristina Barcelona, o realizador consegue retratar toda a sociedade em apenas 90 e poucos minutos. Sempre à volta do amor, das relações pessoais, de uma constante procura de um sentido para a vida acompanhada pela razão e pela emoção, sendo que sobre estas últimas vai mais longe, personificando-as em Vicky e Cristina.
Por um lado, assume uma posição céptica, por vezes quase crítica perante a sociedade convencional de hoje, isto é, perante uma sociedade que quase obriga, sob pena de rejeição social p.e., a que cada um dos seus membros siga "à risca" o convencionalmente aceite como "natural". Por outro lado, parece-nos que faz um pouco a apologia do boémio, do artístico, do amor simultâneamente "sexual-animalesco" com a perfeição intelectual da relação, não deixando de o criticar também. Coloca-nos a exentricidade sexual e artística num lado, e o programado, o materialista e socialmente pré-definido noutro lado.
Com uma avalanche de sentimentos e cores quentes, Woody Allen nem parece um americano a realizar em Barcelona. Consegue com precisão, muito requinte, cosmopolitismo, um humor muito refinado e uma ironia muito própria, filmar a cidade catalã sem parecer um qualquer espólio fotográfico de um guia American Express.
Penélope Cruz está genuinamente bem ao interpretar Maria Elena, foi portanto merecidíssimo o Oscar que recebeu na categoria de Melhor Actriz Secundária. Scarlett tem a melhor prestação num filme do "seu realizador", mais, não parece a eterna "pão sem sal" que tantas vezes interpreta.
É ainda de referir que, a caracterização física de todos os personagens está tão intimamente ligada ao seu ser comportamental, facto que os torna ainda mais convincentes.
Finalmente, a confusão sentimental de todos os personagens encontra-se intimamente ligada à própria "confusão arquitectónica" de Gaudi ou ainda, à própria confusão do Homem de hoje. Por isto, o filme parece-nos que acaba do mesmo modo como começou: afinal, o Homem não muda em menos de duas horas (tempo real do filme) ou num Verão em Barcelona(tempo da narrativa).
Nota: 9

Gran Torino

Uma sala estridente, histérica, impaciente, barulhenta. Esta foi a plateia de hoje. Péssima!
Gran Torino, a mais recente obra do veteraníssimo Clint Eastwood, em realização e interpretação (em simultâneo), é o resultado de um olhar muito próprio e distinto de ver e viver a, e na, actual sociedade. Da narrativa (em sentido estrito), não há grande coisa a dizer-se: Walt Kowalski, interpretado sublimemente por Eastwood, é um veterano da Guerra da Coreia amargurado com vida, um homem solitário e de poucas falas, viúvo e com uma relação sempre distante com os filhos, o qual se depara com uma realidade que lhe é estranha, ser o único americano no seu bairro. Um céptico realista cru que, acaba por travar amizade com Thao, um jovem Hmong emigrante que lhe tentara roubar o seu Gran Torino de 1972. A isto junta-se um gang Hmong.
A longa metragem não é genial por isto, mas sim, por tudo o que vai retratar e representar através disto.
Por um lado, o retrato de um homem marcado pela guerra, e tudo o que ela cria (o ódio, a rigidez, a auto e hetero-dureza, a solidão, ou ainda, uma quase (tentativo de) auto-suficiência sentimental), um homem vincadamente tradicionalista, patriota, exigente com ele mesmo, mais, o exemplo de um homem de meados do século XX, filho de uma sociedade higienizada e que pretende higienizar. Este é Kowalski. No entanto, há algo de surpreendentemente louvável num personagem protagonista, como este: evolui do ponto de vista comportamental e de atitude, sendo tal, claramente óbvio neste filme. Por outro lado, é também o retrato (através do personagem principal) de uma certa América racista e xenófoba que tem uma séria dificuldade de relacionamento numa multicultural society. Walt Kowalski por vezes não nos parece que fala, mas sim que rosna como um cão (mais até do que a sua Daisy labrador). Com um sentido de humor brilhante, e um sem filtro nas palavras Eastwood criou um personagem ímpar, um personagem ainda "tipo" de uma certa sociedade ocidental que, não soube nem sabe lidar com o new world.
Este é também o filme que cruamente aborda algum choque civilizacional, de âmbito social e cultural entre o Oriente e o Ocidente. Gente que vive naquele que se diz, "o país de todas as liberdades", e que quase se apropria desse mesmo espaço (bairro onde vive) como se vivesse nas suas terras de origem. Afinal tal não passará também de uma manifestação de liberdade?! Certamente que sim.
A concreta película, é também ela sublime e, ao mesmo tempo realista na forma como trata e aborda os delicados temas, pois, contrariamente a Slumdog Millionaire que mostra a Índia pelos olhos de um ocidental pós-colonialista, Gran Torino não ilude ou distorce o que quer que seja, em particular, a realidade da comunidade Hmong dos EUA.
Citando Vasco Câmara, "se Milk, de Gus Van Sant, mostra os anos 70 para falar do presente, que é, na verdade, o fantasma que se intromete na imagem, Gran Torino passeia a câmara pelo presente em ruínas para revelar o mundo que ali está desaparecido".
Notas finais: Clint Eastwood tem uma interpretação perfeita; sobre o filme, muito bom.
Nota: 10

3.13.2009

PORTO, neste fim-de-semana: inaugurações Serralves, Alta Baixa, Clubbing Casa da Música.



Adam resurrected

Uma estreia que mais parecia ter uma audiência de um qualquer filme em exibição há semanas, ou mesmo meses no grande ecrã: apenas 8 "cinéfilos". Admito que os mais entusiastas com "as estreias da semana" tenham visto, e claro, enchido a big room de Bride wars - Noivas em guerra, ou, Gran Torino de Clint Eastwood (no qual, tenho uma enorme expectativa).

Adam resurrected - Adam renascido, de Paul Schrader, (realizador que nos anos 70 trabalhou com Sydney Pollack, Brian De Palma ou ainda, Martin Scorsese), é o filme da obra homónima de Yoram Kanuik.
É uma longa-metragem surpreendentemente diferente do registo de obras que estamos habituados a ver, mais, a ideia de filme (sempre concebida a priori de o vermos) é completamente arrasada quando o pano cai.
A concreta película, aborda do princípio ao fim, um lado por vezes esquecido de tudo o que acontece (de mau) e, aconteceu (de muito mau) na História da Humanidade: aqueles que a isso sobreviveram. Adam resurrected tem localização espácio-temporal em Telavive, nos início dos anos 60, em particular, numa clínica psiquiátrica instalada no deserto. Nela, além do pessoal médico, vivem individúos (presas), sobreviventes do Holocausto nazi (judeus alemães). Pessoas que mais parecem marionetas de uma memória que as aprisiona, de um passado que lhes foi cruel. Vidas de seres humanos que mais parecem esquecidas por uma sociedade moralizante do pós-Guerra. Este é o contexto que surge para contar o passado de Adam Stein, um palhaço, um mágico artista, enfim, um comediante famoso na Alemanha pré-Guerra. No entanto, também ele, um homem normal, comum, com família, pai, tendo contudo, um sentido de humor sempre apuradíssimo. Anos depois do começo da Guerra, o protagonista é enviado com a sua família para um campo de concentração onde, ao chegar é separado desta, para servir de entretenimento a Klein - Comandante nazi. Klein, um homem obediente (afirma, como que desculpabilizando-se com o "fenómeno nazi" que, não é ele quem faz as regras; mais, sem regras reinaria o caos), frustrado, enfim, com enormes problemas de auto-estima, transforma Adam no seu segundo "Rex", ou seja, no seu segundo cão de estimação: Adam é o seu biblô humano. Este é o trauma de Adam: tornou-se quase instintivo como um cão e, não conseguiu salvar a sua mulher e a filha mais nova dos "fornos". Apesar de tudo, sobrevive.
Um filme, onde a fé individual é constantemente posta em causa, onde os porquês à própria História sucedem-se sem respostas, onde a memória é colocada como um inimigo pior do que Hitler, enfim, onde o passado vivido é visto quase como um castigo. Um filme extremamente simbólico e figurativo: o aprender a ser um ser humano de David, com a libertação psicológica/"cura pós-traumática" de Adam, são exemplo disso. Um filme que, muitas vezes parece conter algo de não real, quase mágio, ou mesmo surreal, sabendo que trata de uma temática provada como acontecida.
De notar ainda alguns aspectos de realização: Paul Schrader mistura cinema toutes les couleurs com cinema noir. O primeiro preenche a maioria da longa-metragem simbolizando o "pós-trevas nazi", o segundo, todas as "memórias Klein", isto é, todo o tempo passado no campo de concentração e, anos antes no "Circo Adam", enfim, todo o tempo em que Hitler era "rei e senhor" (ou achava-se!). Mais um exemplo (no caso, técnico), onde a simbologia está presente e faz questão em se notar.
Nota: 8

3.09.2009

En chair et en os

Há realizadores que, ou se adoram, ou se odeiam. Pedro Almodovar é um exemplo disto mesmo. Com um trabalho reconhecido e aclamado pelo público e pela crítica, Almodovar é um nome inultrapassável no cinema em geral, no cinema espanhol em particular. Com um trabalho, um estilo de realizar muito próprio e, com uma abordagem amplamente reflectiva sobre a sociedade e alguns dos seus aspectos mais intímos, o realizador europeu tem o dom de tratar de temáticas (muitas vezes) tabú de uma forma no mínimo sui generis.
En chair et en os - Em carne viva/Carne trémula (de 1997), sai um pouco fora do estilo e da forma de realizar Almodovar, não deixando de ser no entanto um bom filme.
A longa-metragem conta a história do "inocente", inexperiente, e confiante mas persistentemente azarado, Victor Laballe; muito bem interpretado por Liberto Rabal. Victor é um rapaz de 20 anos, filho de uma prostituta, Isabel Laballe (Penélope Cruz), que o "pariu" num autocarro público de Madrid em 1970, no auge das "restrições franquistas" de liberdades fundamentais.
Depois de uma noite ("a primeira" de Victor) de sexo e droga com uma desconhecida de nome Elena (Francesca Neri), num WC de uma discoteca madrilena, Victor, religiosamente guarda num pedaço de um guardanapo a morada e o respectivo contacto da "sua primeira". Dias depois ao contactá-la, apercebe-se do desprezo de Elena perante a sua insistência obsessiva em reencontrá-la. Contudo, Elena, pensando tratar-se do dealer por quem esperava deixa entrar Victor em sua casa. Minutos depois tudo se complica com a chegada de dois polícias: Sancho (Jose Sancho) e David (Javier Bardem).
O fatídico "encontro a quatro" acaba com tiros e afins: David fica agarrado a uma cadeira de rodas, vindo a tornar-se atleta paraolímpico vencedor de várias medalhas em Barcelona 92; Sancho continuará a violentar a mulher, Clara (esta continuará a trair Sancho) (Angela Molina), e claro, a embebedar-se consecutivamente; Elena, uma punk fora de tempo de origem italiana, vem a casar-se com David como que uma "poção mágica" para acabar com o seu complexo de culpa; e Victor, vai preso seis anos por alegadamente ter atingido David. Esta é a premissa umbilical que contextualiza os personagens e os seus relacionamentos durante o filme.
Uma película onde os personagens são tudo menos tábua rasa de algum protótipo, personagem histórica, personagem-tipo, enfim. Não conseguimos defini-los por completo até ao fim do filme; são verdadeiras "personagens redondas", como usualmente costumamos designar na literatura. Não há vilões ou heróis, bons ou maus. Em suma, dos cinco personagens centrais da narrativa há manifestações de todos os estados de alma, (quase em simultâneo): paixão, violência, ódio, amor, ciúme, obsessão, enfim, tudo quanto há.
Um thriller, adaptado da obra de Ruth Rendell, que persiste em unir o não unível, (para alguns pelo menos): a recorrência nos diálogos (alguns num tom vulgar) de assuntos como o sexo e a droga, unidos com a Bíblia, e/ou incorporados/integrados em frases bíblicas.
En chair et en os, é também o filme dos espaços exageradamente e, diabolicamente kitsch. O descontrolo de cores e uma quase proliferação de cruzes e pequenos altares caseiros impera em todos os espaços físicos.
Finalmente, a referenciar ainda que, Almodovar é único no modo como torna uma problemática dita séria, num assunto quase vulgar e/ou cómico.

Nota: 9

3.08.2009

Bella

Findou hoje mais um fim-de-semana. Um fim-de-semana que teve como epicentro da vanguarda artística e cultural a cidade do Porto: afinal, no passado Sábado inauguraram as galerias de arte contemporânea do chamado, "quarteirão de Miguel Bombarda". Um verdadeiro evento cultural que, torna ainda mais, o Porto como um centro de desenvolvimento cultural e social, enfim, torna a Invicta além de uma cidade turístico-gastronómica (p.e.), uma cidade de cultura e cosmopolitismo. Áreas que devem ser a aposta no novo turismo em Portugal. Obras de artistas como Ângelo de Sousa ou Gerardo Burmester estão presentes em alguns espaços de difusão e comunicação artística da Rua de Miguel Bombarda no Porto.
Pois bem, nada como acabar o fim-de-semana também com uma arte, a sétima: escolhi para ver hoje no cinema, Bella, uma película de Alejandro Gomez Monteverde.
Bella não tem uma história nada demais, é simples, comum, banal: conta-nos a história de vida de dois personagens, Nina e José. Ela, uma empregada de mesa desempregada que tenta sobreviver numa NYC despersonalizada, pouco humanizada, demasiado agitada, demasiado despreocupada. Uma mulher sofrida, por vezes quase abandonada por todos (e por si): tendo perdido o seu pai aos 12 anos, não tendo irmãos e com uma mãe paralisada pela vida, Nina conhece José no restaurante do irmão do primeiro. Um cozinheiro, ex-futebolista, que viu a sua carreira arruinada por ter atropelado uma criança anos antes. Filho de uma família "Porto-Mex" (porto-riquenha, mexicana), vive atormentado com o fatídico acontecimento do qual foi culpado. Quase um auto-retrato de Alejandro Gomez Monteverde, pois também ele mexicano, esta primeira longa-metragem do realizador consegue um resultado simpático, ainda que próximo do exagero dramático, onde tudo aquilo que é comum preenche os 90 minutos de filme.
Bella é também uma mostra da realidade de uma comunidade latino-americana nos subúrbios de NYC: uma comunidade fechada em si, com hábitos e costumes culturais muitos próprios, onde a real integração social fica longe sequer do suficiente.
Bella foi selecção do Toronto International Film Festival.

Nota: 6

3.05.2009

Slumdog Millionaire

(Deveria ter sido ao contrário mas), depois dos Oscars, hoje fui ver Slumdog Millionaire - Quem quer ser bilionário?, longa-metragem vencedora este ano, do realizador de Trainspotting ou Sunshine, Danny Boyle.
O película é claramente Hollywood e, Bollywood do princípio ao fim dos 120 minutos do filme: tem uma história de amor; tem encontros e desencontros amorosos; tem pobreza e riqueza; tem show off; é uma "grande produção"; tem um irmão mau, e um irmão bom; tem bons e maus; e claro, tem um final feliz.
Ao lermos o anterior parágrafo parece que não gostei do filme, mais, que o achei um tanto piroso ou kitsch, mas não, ou pelo menos estritamente, não.
Com um argumento (de base: um amor aparentemente impossível durante 115 minutos de filme, mas com um final feliz e contente - últimos 5 minutos) nada inovador, Danny Boyle foi pelo contrário extremamente original na forma como o adaptou. Apesar de ser a temática mais recorrente e usada (quase gasta), ao longo da história do cinema, o realizador inovou tornando-o actual.
Por um lado, caracteriza sensorialmente (através da visão e por vezes do olfacto) a Índia, apontando gravíssimos problemas sociais, e outros culturais; problemas que numa Democracia como a Índia o são ainda menos admissíveis. Por outro lado, relaciona muitíssimo bem algumas ancestrais tradições/costumes culturais indianos com, exemplos e outros ícones do capitalismo contemporâneo (o programa de TV que dá nome ao filme, na versão portuguesa claro, é aliás exemplo disso) e, o modo como ambos os factores co-habitam e, se interligam actualmente no quotidiano social indiano.
De notar ainda, a forma (à grande produção!) como Boyle consegue no mesmo filme contar uma mesma história de vida em três tempos diferentes.
Um retrato singular de uma cultura, feito através de um personagem com origens num bairro de lata, acompanhado de uma fenomenal banda sonora de A. R. Rahman.
Em suma, e, apesar de compreender o porquê de ter sido Slumdog Millionaire o vencedor do Óscar para Melhor Filme, (afinal, como escrevi no início, este filme é tudo aquilo que a Academia gosta) The Reader e Milk também estariam definitivamente à altura de tal distinção.

Nota: 7

L'Heure d'été

Antes de sair de casa para ir à aula de francês a vontade era pouca ou, mesmo nenhuma em atravessar a Avenida da Boavista até à Alliance Française. Porém, o mesmo estado de vontades depressa se alterou quando a encantadora Professora nos oferece convites para a ante-estreia de um filme. Estado de vontades: (agora), no seu melhor; (apesar de ser nas pouco confortáveis salas - sem pipocas - do Cidade do Porto). Pois bem, vim de lá agora.

L'Heure d'été - Tempos de Verão, do realizador Olivier Assayas, também ele realizador de Paris, je t'aime, traça-nos um simbólico retrato familiar de uma alta burguesia intelectual tão ao estilo francês. O pretexto que inicia o filme é o 75º aniversário de Hélène , (tão brilhantemente interpretada por Édith Scob), no qual toda a família se reúne. Frédéric (Charles Berling) vem de Paris, Adrienne (Juliette Binoche) de NYC e, Jérémie (Jérémie Rénier) de Shangai. Eles e os filhos se reunem na casa de Hélène na province, para o único encontro anual da família: o aniversário da primeira.
Podemos afirmar que tal como as três gerações presentes no retrato familiar que faz cartaz da película, o realizador também dividiu o filme por três partes.
À primeira vista, tudo parece simpático, agradável, "saudável". Contudo, o presentir da morte por parte de Hélène leva-a a falar, quase repetindo-se sobre o seu fim e, as consequentes consequências disso. Mais, quando se vê de novo sozinha, o peso da solidão aumenta.
Com a sua morte, os três filhos começam por discutir sobre o que fazer à casa, à vastíssima colecção de arte, além do valioso espólio de mobiliário de Arte Nova. Decidem a venda da primeira e de parte da segunda, vendem a terceira ao Museé d'Orsay de Paris. De notar que, é a casa, o epicentro do desenrolar da narrativa. Também ela, tal como os personagens, vai mudando, pelo menos de estatuto para estes: de casa de família, a imóvel em avaliação repleto de arte, também ela em avaliação, para, finalmente e já em fase de pré-venda, se encontrar vazia de personalidade abrigando uma rap party organizada pelos netos de Hélène. A descrição destas três gerações de uma família está notável: o permanente simbolismo visual do vestuário e dos espaços vai acompanhando o tempo e as suas evoluções. Desde espisódios como Hélène ter sido a última paixão do seu cunhado, um famoso pintor, e daí ter havido uma relação ente ambos, passando por hábitos em fumar droga por parte filha de Frédéric, a qual fora educada (liberalmente).
Um bom e agradável filme que reflecte sobre o valor da memória (colectiva, familiar, enfim) e do passado, tantas vezes hoje desvalorizado socialmente: tal como Hélène diz à sua filha Adrienne, "gostas pouco de coisas com o peso dos anos".
Uma produção do Museé d'Orsay seleccionada nos Festivais de Cinema de NYC, San Sebastian e Toronto. Uma longa-metragem que só nos apetece voar amanhã para Paris!
Nota: 8

3.04.2009

Doubt

Depois dos óptimos dias que passei em Itália, nada como voltar à rotina. (Comummente costumamos utilizar a palavra rotina, como que associada a um hábito ou a uma prática reiterada de certos comportamentos, com um sentido não positivo. No entanto, nem sempre assim o é: afinal as várias idas ao cinema são prova disso mesmo).
Com o sentido de aproveitar para ainda ver no grande ecrã alguns dos filmes premiados em diversas instâncias do cinema em 2009, decidi (apesar da "dúvida") ver hoje o filme Doubt - A dúvida, do realizador John Patrick Shanley.
Doubt, parece à primeira vista contar-nos a história da relação de um rapaz de raça negra com um padre e, uma freira pouco simpática, tendo como realidade espacio-temporal uma paróquia no Bronx em 1964. Nada animador portanto. Contudo, a referida "lengalenga" apenas serve de premissa inicial àquilo que Shanley pretende transmitir: o confronto de doutrinas (conservadoras e progressistas) e posições (antagónicas) e, as consequentes dúvidas (e certezas) que daí surgem. Dúvidas perante a fé, dúvidas perante o comportamento humano, dúvidas sobre a instituição Igreja (e claro, quem a dirige), dúvidas que parecem certezas perante o outro.
Com um bom texto, Doubt vence e vale a pena pelas sublimes interpretações de Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman e Amy Adams. Representando seres humanos distintos entre si e, nas atitudes perante a vida; os três personagens tipificam quase personagens-tipo: da tolerância e da falta dela, da compaixão e da falta dela, da integridade e da falta dela, enfim.
De notar que, Shanley além de realizador foi também autor do argumento e do texto, sendo um tanto autobiográfico da sua própria infância.
(Apesar de ainda não ter visto a longa-metragem de Woody Allen rodada em Barcelona, a qual valeu a Penélope Cruz o Óscar na categoria de Melhor actriz secundária, admito ainda assim que, Amy Adams também o merecesse. Esta surpreendentemente bem. Analogamente o afirmo em relação a Philip Seymour Hoffman e, neste caso vi The dark night).

Finalmente, e, por não o ter feito na altura em que vi a peça A dúvida no TNSJ, com a Eunice Muñoz e o Diogo Infante, encenada pelo último, de realçar as memoráveis interpretações que também eles tiveram nos papéis da Irmã Aloysius e do Padre Flynn, respectivamente.

Nota: 8

3.03.2009

Ganhar a Vida

Ganhar a Vida, do realizador João Canijo tem à primeira vista um argumento pobre, banal, comum, enfim mais do mesmo. E, no limite, assim o é. Contudo o discípulo de Manoel de Oliveira, como quem trabalhou no início dos anos oitenta, e/ou de Wim Wenders, adapta-o de forma brilhante.
A longa-metragem do realizador português conta-nos a história pobre, banal, comum, enfim mais do mesmo, de uma mulher que perde o seu filho. Cidália Ribeiro, interpretada de forma sublime por Rita Blanco é uma mulher emigrante portuguesa que vive na periferia de Paris, em Villeneuve de Saint Georges. Cidália, uma empregada de limpezas, vivendo em difíceis condições económicas, vive a trabalhar na esperança de uma melhor vida, com o objectivo de um dia voltar para Portugal. Até aqui, a história é de uma mulher pobre, banal, comum, enfim mais do mesmo; contudo, um dia o seu filho mais velho, Álvaro, é brutalmente assassinado pela Polícia. A partir daqui, toda a vida de Cidália se vai degradando. A viver no seio da comunidade emigrante nacional nos arredores de Paris, Cidália não aceita as evidências do facto, revoltando-se, tentando agir contra a polícia, enfim, tentando superar a morte do seu filho. O argumento é isto, somente isto. É com tudo o resto, especialmente com o desempenho de Rita Blanco que, João Canijo faz deste filme, um excelente exemplo da boa produção de cinema português.
O retrato que faz dos emigrantes portugueses revela-nos uma comunidade fechada, envergonhada, com medo, pouco unida, "guetizada", com enormíssimos problemas sociais e de integração na sociedade, no caso a francesa. É assustador pensar-se que o maior inimigo de Cidália fora a sua própria comunidade, ao ponto de lhe destruírem e queimarem a casa, apenas por confrontar a Polícia com respostas, com a verdade.
Com uma realização intencionalmente (quase) amadora/primária, Ganhar a Vida, vence pelo simbolismo: a tentativa da comunidade de emigrantes em recriar um ambiente que lhes seja familiar (português, portanto) é sinónimo de Fátima, Futebol (SLB), Fado, (bacalhau, ranchos folclóricos, Goucha, Romana, Anjos ou Ágata). Os ambientes propositadamente escurecidos e humildes, onde abundam Santas e flores de plástico, servem de palco a problemas familiares de total desestruturação do agregado, onde a violência doméstica convive ("desde que não vá para o hospital") com uma religiosidade cega, bem como, com a delinquência juvenil.
Uma obra neo-realista produzida por Paulo Branco, que versa sobre pessoas sem terra, sem identidade, sobre uma comunidade em que o silêncio é a regra, numa tentativa de quase auto-suficiência.
De notar por fim que, Ganhar a Vida, de João Canijo fez parte da Selecção Oficial do Festival de Cannes em 2001.

Nota: 9

3.02.2009

Indietro!

Depois de quase uma dezena de dias de férias em Itália, respectivamente em Roma, Veneza (e de novo, Roma), as regulares crónicas no boulevard.246 regressam.

Posto isto e, apesar de já passada, merece a cerimónia dos Óscares de 2009 algumas notas: dada a já repetida falta de tempo em época de exames, não pude ver todos os filmes que pretendia até à noite da sétima arte no Kodak Theatre. Senão vejamos: ainda não vi Vicky Cristina Barcelona ou ainda, o vencedor Slumdog Milionaire. Por isso, naturalmente não me pronunciarei sobre as categorias de melhor filme e de melhor actriz secundária, no caso, Penélope Cruz. Ficarão futuras crónicas sobre as mesmas películas para esta semana (espero!).
Contudo, apesar de não ter sido uma surpresa, fiquei extremamente satisfeito com os vencedores dos óscares de melhor actor (Sean Penn) e de melhor actriz (Kate Winslet). As razões estão expostas nos posts dos filmes Milk e The Reader - O Leitor, respectivamente.

Estes dias na Città Eterna, apenas me reservaram o último dia do 29º Fantasporto. Pois bem, não perdi a oportunidade e lá fui ontem ver The Escapist, do realizador Rupert Wyatt. Uma longa-metragem que narra a vida Frank Perry (Brian Cox), um prisioneiro que tenta escapar da prisão. Parece algo realista, mas não, a sua marca de "fantástico" mantém-se. Um filme com poucos e infantis diálogos (e, ainda bem! Afinal o filme não era legendado...) onde a imagem sim, é essencial, fazendo esta, o próprio acontecer/desenrolar da trama. Uma película onde o real e o imaginado quase se confundem. Essa também é a confusão interior do protagonista.